De janeiro até setembro de 2017, em Pernambuco, quase 800 cães tiveram resultados positivos para a presença do parasito Leishmania, ou seja, cerca de 90 por mês

Desafios de controle do vetor e importância de uma abordagem integrada para frear o avanço da enfermidade que teve aumento de 44,5% em 2017. Entre os animais, mais de 500 cachorros foram eutanasiados. 

Além do impacto nos humanos, a leishmaniose visceral (LV) também provoca estatísticas assustadoras em cães no Estado. Esses animais, estigmatizados como culpados pela transmissão para as pessoas, também são vítimas da doença, mas na maioria das vezes acabam eutanasiados. De janeiro até setembro de 2017, em Pernambuco, quase 800 cachorros tiveram resultados positivos para a presença do parasito Leishmania, ou seja, cerca de 90 por mês. A maioria, 556 animais (70%), acabou sendo sacrificada, uma vez que as normas sanitárias e de saúde do Brasil ainda orientam a morte do animal como medida de controle. A eutanásia canina, no entanto, ainda gera controvérsia diante de uma doença que é muito mais plural.

“As pessoas acham que matando cachorro vai haver controle da leishmaniose. O que vai controlar de imediato é borrifação na área e a busca ativa para localizar pessoas com sintomas e encaminhá-las para um teste rápido. Ainda se faz a eutanásia animal porque tem que ser tirado do território o reservatório do parasito, no caso o cão”, afirmou o gerente de Vigilância e Controle de Zoonoses do Estado, Francisco Duarte. O gestor contou que o teste rápido aplicado nos animais e que é fornecido pelo Ministério da Saúde (MS), inclusive, está praticamente zerado, o que protela a confirmação sorológica dos cães.

Até o fechamento desta edição, o MS não havia respondido o porquê da falta do produto nem quando poderia regularizá-lo. O indicador animal de doença acima de 4% da população canina de um território aponta para a transmissão ativa do parasito. Duarte elencou que a vigilância dos reservatórios caninos é importante, mas precisa caminhar conjuntamente com o monitoramento dos casos e óbitos humanos e, também, com monitoramento e controle dos flebotomíneos, insetos vetores popularmente conhecidos como mosquito-palha.

Presente em várias áreas do Estado, os flebotomíneos não nascem infectados. Só as fêmeas transmitem e após se alimentarem de um animal infectado. Segundo o pesquisador do Laboratório de Imunoparasitologia da Fiocruz/Pernambuco, Filipe Dantas Torres, o inseto vive em média 20 dias e costuma picar no fim da tarde e à noite. Diferentemente dos mosquitos de Aedes e Culex, as larvas e pupas se proliferam no solo rico em matéria orgânica, em locais sombreados e úmidos. “A coleta de insetos vetores para identificação da espécie e estudo da sazonalidade se faz de modo intermitente”, criticou.

O coordenador estadual do Sanar, Alexandre Menezes, ainda expôs mais um atrativo para os flebotomíneos na atual desordem urbana: a ausência de saneamento. “O mosquito procria em solo com muita matéria orgânica e nas cidades o que vemos é esgoto a céu aberto, áreas sem pavimentação, presença de criadouros de animais como galinheiro e pocilga”, comentou.

É nesse cenário, descrito por Menezes, que está a maioria das cidades que tiveram aumento de casos de LV nos últimos anos. A precariedade de saneamento somada ao avanço dos municípios sobre as matas potencializam os riscos e a ocorrência do adoecimento das populações humanas e caninas.

País reúne 96% dos casos de leishmaniose
O Brasil concentra 96% dos relatos de casos de leishmaniose visceral nas Américas, de acordo com o último informe epidemiológico da Organização Mundial da Saúde (OMS). O relatório classifica a nação como País com transmissão em expansão, numa clara demonstração da situação de alerta. O Brasil ainda ocupa do topo das notificações de coinfecção de LV e HIV.

Para o pesquisador Filipe Dantas Torres, esse contexto nacional e regional da LV traz a urgência de discussões sobre uma abordagem atualizada da leishmaniose visceral, que internacionalmente atende pelo nome de One Health (Saúde Única). “Esse termo surgiu no século 21, como uma evolução do termo One Medicine (Medicina Única). O conceito propõe uma visão integrada da saúde, a partir do entendimento de que a saúde humana, a animal e a ambiental estão inter-relacionadas”.

Nessa perspectiva, médicos, veterinários e ambientalistas precisam trabalhar em conjunto os desafios da saúde pública, como o avanço das zoonoses (doenças transmitidas de animais para os homens). E essa é uma tendência mundial. O Centro de Controle de Doenças dos Estados Unidos (CDC) indica que o desequilíbrio entre homem, animal e meio ambiente é o principal responsável pelas atuais pandemias e mortalidade das populações. O CDC afirma ainda que as zoonoses respondem por 75% das doenças emergentes. No Brasil, por exemplo, cerca de 20 agravos de notificação compulsória são deste tipo, como a leishmaniose visceral.

“Essa doença só será controlada quando as populações de risco tiverem uma melhor nutrição (aumenta a resistência contra o parasito), melhores condições de moradia (reduz a exposição aos vetores) e mais educação em saúde”, reforçou Dantas.


Dr. Fábio Fidelis
Dr. Fábio Fidelis

Sou amante dos animais desde de criança, minha família tem um grande vinculo com os animais e tenho vários membros da família na profissão de médico veterinário inclusive o meu incrível pai (Dr. Eduardo Costa) o qual tenho extrema admiração! - Conclui o curso de Medicina Veterinária pela UFMG em 2011. - Pós graduação em ultrassonografia em 2012. - Pós graduação em clinica e cirurgia de pequenos animais em 2014. - Pós graduação em anestesiologia em 2014. - Pós graduação em ortopedia em 2014. - Pós graduação em Leishmaniose desde 2015. - Pós graduado em Dermatologia em 2017. - Autor do Livro: O Cão Não É O Vilão - Idealizador do Curso: Os Segredos Da Leishmaniose Canina - Hoje atuo como médico veterinário no Hospital Veterinário Cambuá em Bom Despacho (Minas Gerais) - http://hospitalveterinariocambua.com.br

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